Jean-Luc Godard (esq.) e François Truffaut (dir.).
A expressão cinema de autor ou de auteur como foi cunhada pelos franceses
no final dos anos 40, mais precisamente pelos críticos André Bazin e Roger
Leenhardt, define um cinema feito sob o olhar do seu diretor; a expressão de
autor significa uma produção artística controlada por um artista só, então o
que diferencia o cinema de autor é a falta de interferência de produtores,
singularizando a visão do diretor para o filme. Bazin, que foi uma espécie de
padrinho de François Truffaut, influenciou a sua visão de cinema- já que ele obteve
sua “educação cinematográfica” com Bazin- e fez com que o trabalho como crítico
e depois como cineasta de Truffaut valorizasse o cinema de autor; algo que se
expandiu para os outros diretores da mesma geração que frequentavam a Cinémathèque de Henri Langlois em Paris:
Jean-Luc Godard, Claude Chabrol, Jacques Rivette, entre outros- e queriam fazer
cinema como seus ídolos Alfred Hitchcock e Robert Bresson.
Quando se fala de cinema de autor e desta
geração de diretores, não se pode deixar de falar do ano de 1959 e do Festival
de Cannes daquele ano. Durante a década de 50, quando Truffaut e Godard eram
críticos da revista Cahiers du cinema,
eles criticavam duramente o cinema que estava sendo feito na França e o
Festival de Cannes, até Truffaut ter seu filme, “Os incompreendidos” como
representante da França no Festival de Cannes de 1959. Com o sucesso do filme
no festival, foi alardeado que uma nova era no cinema francês começava, Godard
falou sobre ter sido uma vitória para os diretores que queriam fazer o cinema
de autor: “Nós vencemos o dia (...) Em ter reconhecido que um filme de
Hitchcock, por exemplo, como tão importante quanto um livro de (Louis) Aragon.
Autores de cinema, graças a nós, finalmente entraram para a história de arte”. François
Truffaut também escreveu em êxtase: “Os filmes de amanhã serão feitos por
aventureiros, jovens cineastas vão se expressar na primeira pessoa e nos contar
sobre as suas experiências. Os filmes de amanhã não serão feitos por
funcionários da câmera, mas por artistas que veem o cinema como uma incrível e
empolgante aventura.”
Jean-Pierre Léaud, ator principal de "Os incompreendidos"(1959), no Festival de Cannes de 1959.
Os anos seguintes realmente
cumpriram as promessas de Truffaut e Godard, o cinema francês dos anos 60
conhecido como Nouvelle Vague (nova
onda) é um marco do cinema de autor. Vários diretores famosos se inspiraram
nesse movimento e construíram suas próprias carreiras como autores de cinema,
Martin Scorsese e Quentin Tarantino são dois exemplos. O cinema de autor não
ficou nos filmes europeus do passado, diretores atuais como Wes Anderson, Paul
Thomas Anderson, Woody Allen, Terrence Malick, Todd Haynes, Pedro Almodóvar e
Jim Jarmusch possuem características estéticas e narrativas próprias reconhecidas
em todos os seus filmes; não se pode falar de Wes Anderson sem que se lembre
imediatamente do colorido dos seus filmes ou de Terrence Malick sem pensar na
natureza ou ainda de Tarantino sem pensar na violência e nos personagens
vingativos.
"Moonrise Kingdom" (2012), de Wes Anderson.
Apesar de muito festejados, o cinema de autor também sofre críticas,
isso é porque o cinema não é feito por uma só pessoa, sempre é fruto de um trabalho
coletivo. Desde antes do termo de autor surgir, o diretor já era considerado a
figura mais importante do set de
filmagens, mas o que se discute e se aponta atualmente é a importância de
outros profissionais de um filme para a inspiração do mesmo. Às vezes, o
diretor de fotografia ou ator/atriz principal podem ser os grandes responsáveis
pelo estilo de um filme.
Apesar deste texto ser sobre cinema de autor, é preciso mencionar que já
existe a expressão “televisão de autor”, o que se deve a uma nova era que a TV
americana tem tido na última década; contando com o apoio de vários
profissionais do cinema que estão migrando para as telinhas. A série “The Knick”
teve 20 episódios todos dirigidos por Steven Soderbergh, a recente “The Young Pope” surgiu da mente do
diretor italiano Paolo Sorrentino, a minissérie “The Night Manager” foi
completamente dirigida por Susanne Bier, “True Detectice” teve sua primeira
temporada dirigida toda por Cary Joji Fukunaga e a segunda produzida por ele;
“House of Cards” e “Narcos” são produzidas por David Fincher José Padilha respectivamente e apesar de
ambas terem tido apenas alguns episódios dirigidos por estes diretores, a marca
deles continua em todo o resto da série.
O cinema de autor é responsável por produzir verdadeiras obras de arte
do cinema e por, em determinado momento, ligar a palavra ao cinema. Apesar da
atividade cinematográfica ser essencialmente coletiva, um cineasta é capaz de
expor sua visão original do mundo em um filme e guiar sua equipe para atingir a
estética e narrativa desejadas e fazê-los trabalharem juntos para atingir o
produto final. Como um maestro que faz todos os seus instrumentistas tocarem
harmonicamente.