domingo, 6 de maio de 2018

Cinema de autor


Jean-Luc Godard (esq.) e François Truffaut (dir.).

  A expressão cinema de autor ou de auteur como foi cunhada pelos franceses no final dos anos 40, mais precisamente pelos críticos André Bazin e Roger Leenhardt, define um cinema feito sob o olhar do seu diretor; a expressão de autor significa uma produção artística controlada por um artista só, então o que diferencia o cinema de autor é a falta de interferência de produtores, singularizando a visão do diretor para o filme. Bazin, que foi uma espécie de padrinho de François Truffaut, influenciou a sua visão de cinema- já que ele obteve sua “educação cinematográfica” com Bazin- e fez com que o trabalho como crítico e depois como cineasta de Truffaut valorizasse o cinema de autor; algo que se expandiu para os outros diretores da mesma geração que frequentavam a Cinémathèque de Henri Langlois em Paris: Jean-Luc Godard, Claude Chabrol, Jacques Rivette, entre outros- e queriam fazer cinema como seus ídolos Alfred Hitchcock e Robert Bresson.
 Quando se fala de cinema de autor e desta geração de diretores, não se pode deixar de falar do ano de 1959 e do Festival de Cannes daquele ano. Durante a década de 50, quando Truffaut e Godard eram críticos da revista Cahiers du cinema, eles criticavam duramente o cinema que estava sendo feito na França e o Festival de Cannes, até Truffaut ter seu filme, “Os incompreendidos” como representante da França no Festival de Cannes de 1959. Com o sucesso do filme no festival, foi alardeado que uma nova era no cinema francês começava, Godard falou sobre ter sido uma vitória para os diretores que queriam fazer o cinema de autor: “Nós vencemos o dia (...) Em ter reconhecido que um filme de Hitchcock, por exemplo, como tão importante quanto um livro de (Louis) Aragon. Autores de cinema, graças a nós, finalmente entraram para a história de arte”. François Truffaut também escreveu em êxtase: “Os filmes de amanhã serão feitos por aventureiros, jovens cineastas vão se expressar na primeira pessoa e nos contar sobre as suas experiências. Os filmes de amanhã não serão feitos por funcionários da câmera, mas por artistas que veem o cinema como uma incrível e empolgante aventura.”


Jean-Pierre Léaud, ator principal de "Os incompreendidos"(1959), no Festival de Cannes de 1959.

  Os anos seguintes realmente cumpriram as promessas de Truffaut e Godard, o cinema francês dos anos 60 conhecido como Nouvelle Vague (nova onda) é um marco do cinema de autor. Vários diretores famosos se inspiraram nesse movimento e construíram suas próprias carreiras como autores de cinema, Martin Scorsese e Quentin Tarantino são dois exemplos. O cinema de autor não ficou nos filmes europeus do passado, diretores atuais como Wes Anderson, Paul Thomas Anderson, Woody Allen, Terrence Malick, Todd Haynes, Pedro Almodóvar e Jim Jarmusch possuem características estéticas e narrativas próprias reconhecidas em todos os seus filmes; não se pode falar de Wes Anderson sem que se lembre imediatamente do colorido dos seus filmes ou de Terrence Malick sem pensar na natureza ou ainda de Tarantino sem pensar na violência e nos personagens vingativos.


"Moonrise Kingdom" (2012), de Wes Anderson.

  Apesar de muito festejados, o cinema de autor também sofre críticas, isso é porque o cinema não é feito por uma só pessoa, sempre é fruto de um trabalho coletivo. Desde antes do termo de autor surgir, o diretor já era considerado a figura mais importante do set de filmagens, mas o que se discute e se aponta atualmente é a importância de outros profissionais de um filme para a inspiração do mesmo. Às vezes, o diretor de fotografia ou ator/atriz principal podem ser os grandes responsáveis pelo estilo de um filme.

  Apesar deste texto ser sobre cinema de autor, é preciso mencionar que já existe a expressão “televisão de autor”, o que se deve a uma nova era que a TV americana tem tido na última década; contando com o apoio de vários profissionais do cinema que estão migrando para as telinhas. A série “The Knick” teve 20 episódios todos dirigidos por Steven Soderbergh,  a recente “The Young Pope” surgiu da mente do diretor italiano Paolo Sorrentino, a minissérie “The Night Manager” foi completamente dirigida por Susanne Bier, “True Detectice” teve sua primeira temporada dirigida toda por Cary Joji Fukunaga e a segunda produzida por ele; “House of Cards” e “Narcos” são produzidas por David Fincher  José Padilha respectivamente e apesar de ambas terem tido apenas alguns episódios dirigidos por estes diretores, a marca deles continua em todo o resto da série.
  O cinema de autor é responsável por produzir verdadeiras obras de arte do cinema e por, em determinado momento, ligar a palavra ao cinema. Apesar da atividade cinematográfica ser essencialmente coletiva, um cineasta é capaz de expor sua visão original do mundo em um filme e guiar sua equipe para atingir a estética e narrativa desejadas e fazê-los trabalharem juntos para atingir o produto final. Como um maestro que faz todos os seus instrumentistas tocarem harmonicamente.