domingo, 5 de junho de 2016

Medo e liberdade.

  Eu estava me lembrando de umas histórias agora e achei que seria interessante compartilhá-las em um texto. Eu me lembro de quando eu era criança/pré-adolescente ter me tornado fã dos Jonas Brothers e das outras celebridades da Disney (Hannah Montana, High School Musical..), era o começo do fangirling na minha vida, e acompanhando as carreiras deles eu conheci o programa da Ellen DeGeneres e me tornei fã do programa e dela imediatamente (óbvio, ela e o seu programa são ótimos). Eu sabia que ela era lésbica, talvez eu não soubesse o que isso significava, mas percebia suas roupas masculinas e não achava estranho. Ah! A beleza das crianças não julgarem os outros. Um dia estava voltando da escola mais cedo, de carona com uma vizinha cujas filhas eram muito amigas minhas, elas também tinham os mesmos ídolos e conheciam o programa da Ellen, e então, eu comentei no carro que estava feliz pois ia pegar o programa dela passando na TV (na época, ele passava com frequência em um canal de TV à cabo). Eu não sei se a minha vizinha já sabia ou quem trouxe o assunto à tona, mas ela comentou sobre a sexualidade da comediante: "Isso é errado. Tá na Bíblia. É pecado". Então eu fiquei confusa, e até um pouco chateada, eu pensei: "Se ser gay é pecado, por que Deus faz pessoas gays?" Cheguei em casa e fui relatar o caso para a minha mãe, usando exatamente esta mesma pergunta. "Se ser gay é pecado, por que Deus faz pessoas gays?" Para o meu estranhamento, eu ouvi silêncio da minha mãe, e percebi que ela não estava indignada como eu, o que me decepcionou, pois esperava que minha mãe fosse concordar com a minha indignação. Minha mãe não é uma pessoa preconceituosa, ela jamais diria o que a vizinha disse, mas ela não estava chocada, ela sabia como as coisas eram. Agora eu já estou acostumada com esse silêncio dos que não concordam com a minha indignação. Ou dos que concordam, mas preferem não falar.
   A outra história, eu não me lembro se aconteceu antes ou depois, provavelmente antes, foi em um São João. A minha família, enorme por sinal, sempre se reúne e faz uma grande festa com quadrilha e tudo mais. Eu adorava dançar quadrilha e todo o ano escolhia um primo para ser o meu par. Naquele ano, por alguma razão, escolhi dançar com uma prima minha a quem eu era muito próxima. Minha família não queria deixar, e como eu era criança, eu esperneei e acabei dançando com a minha prima, que era mais nova do que eu e também não viu nada de errado. Eu não entendia o que os outros achavam de tão estranho, eu gostava da minha prima e queria dançar com ela assim como era com os meus primos. Hoje eu me pergunto se meus pais temeram que eu estivesse demostrando alguma tendência à homossexualidade, apesar de eu achar que eles e o resto da minha família só queriam manter a tradição. Eu não sabia o que eram pessoas homossexuais, eu me tornei uma pessoa heterossexual e talvez eu já me percebesse assim na época, eu quis fazer o que tive vontade sem me preocupar com o que os outros iriam pensar. Ah! A beleza da liberdade das crianças em não terem medo do julgamento alheio.

  Eu me pergunto porque a gente faz isto com as crianças. Porque a gente corrompe as crianças com nossas preocupações em relação a coisas idiotas e pequenas. Quando eu era criança eu sabia que a sexualidade da Ellen DeGeneres não afetava em nada a forma como eu a via, que eu podia fazer o que quiser sem medo do que os outros vão pensar. Eu também mudei, eu também fui corrompida. Porque eu me senti nervosa escrevendo este texto pela forma como eu ia ser percebida. Eu não o admito com orgulho. Senti medo de escrever um texto que iria falar em defesa de uma minoria, o que eu acho uma coisa linda, medo do que os outros iam pensar das minhas ideias. Assim como algumas pessoas tem medo de usar a palavra "feminista". Além de termos vergonha de ser o que somos e fazermos o que quisermos, temos medo também de termos nossas ideias. Eu não acho que os meus pais, o resto da minha família e até a minha vizinha tiveram alguma má intenção em fazer o que fizeram, eles seguiram as convenções, convenções que podem existir, mas não devem restringir nossa liberdade ou serem usadas para ofender os outros. Isso afeta a nós todos, porque sempre temos um pouco de vergonha sem necessidade e restringimos um pouco a nossa liberdade por causa disso. Citando Nina Simone, "Liberdade para mim é isto: Não ter medo." Vamos ser livres e deixarmos os outros serem livres.


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